ESTUDO DE CASO: A Fábula dos Porcos Assados na Era Digital

 

Foto de Pascal Debrunner na Unsplash

UMA TRADIÇÃO QUEIMADA PELA INÉRCIA CORPORATIVA

Sou um observador nato. Sempre gostei de entender como as coisas funcionam, especialmente dentro das organizações. E se tem algo que aprendi ao longo dos anos, é que as maiores ineficiências não vêm da falta de tecnologia ou inovação, mas da resistência à mudança.

Certa vez, trabalhando como consultor para uma grande empresa de logística, ouvi uma história curiosa – a Fábula dos Porcos Assados. A versão original é antiga, mas resolvi atualizá-la para nossos tempos modernos. E, acredite, ela ainda faz todo o sentido.

1. O INÍCIO DA GRANDE TRADIÇÃO

Tudo começou há muito tempo, quando um incêndio florestal por acaso assou alguns porcos selvagens. Os habitantes locais, acostumados a comer carne crua, experimentaram a novidade e ficaram maravilhados. A carne assada era deliciosa!

Decidiram, então, replicar o fenômeno sempre que quisessem um banquete. Como ninguém entendia exatamente o processo, passaram a incendiar florestas inteiras para assar porcos. Parecia um método eficaz e, ao longo dos anos, a prática se consolidou como um sistema estruturado, com regras e procedimentos rigorosos.

As gerações seguintes herdaram a técnica, sem nunca questionar sua eficiência. Com o tempo, o processo se tornou cada vez mais burocrático e institucionalizado.

  • Especialistas foram contratados para escolher as melhores florestas para incêndio.
  • Criaram-se comitês para monitorar o comportamento dos ventos e evitar que o fogo se alastrasse além do necessário.
  • Consultorias internacionais foram chamadas para calcular o tempo exato de queima para obter a suculência perfeita da carne.
  • Softwares de gestão começaram a ser utilizados para prever quando os incêndios deveriam ocorrer.

Milhões de pessoas estavam envolvidas no processo. Havia indústrias inteiras dedicadas à plantação de florestas específicas para o assamento dos porcos. O sistema estava tão bem estabelecido que ninguém ousava questioná-lo.

2. O SISTEMA COMEÇA A FALHAR

Com o tempo, começaram a surgir problemas. Nem sempre o fogo queimava da maneira esperada. Às vezes, os porcos ficavam torrados demais. Outras vezes, nem chegavam a ser assados. A umidade do solo, a composição das árvores e até a intensidade dos ventos tornavam o processo imprevisível.

As queixas aumentavam. Empresas dependiam da carne assada para sobreviver, e cada erro custava milhões.

Para resolver o problema, começaram a organizar eventos anuais para discutir melhorias no sistema. Congressos, seminários, simpósios. Especialistas em fogo, vento e umidade apresentavam suas pesquisas. Mas, no final, a solução era sempre a mesma: aperfeiçoar o sistema existente, nunca mudá-lo completamente.

  • Criaram cursos de pós-graduação em incêndios controlados.
  • Lançaram certificações para especialistas em climatologia do fogo.
  • Contrataram empresas de tecnologia para desenvolver sensores que detectassem a umidade ideal antes de incendiar as florestas.

O sistema estava cada vez mais caro e complexo, mas ninguém cogitava mudar o método de assamento. Afinal, tudo sempre foi feito assim.

3. A CHEGADA DE UM FORASTEIRO

Até que um dia, um jovem analista chamado João Bom-Senso – recém-contratado para o departamento de inovação – olhou para todo aquele processo e perguntou:

Por que queimamos florestas inteiras para assar porcos?

O silêncio foi ensurdecedor. Os diretores, gerentes e especialistas em assamento se entreolharam, desconcertados.

Ora, porque sempre fizemos assim! — respondeu o Diretor-Geral.

Mas João não se deu por satisfeito. Ele passou dias estudando o processo, entrevistando especialistas e analisando dados. Até que chegou à seguinte conclusão:

E se, ao invés de incendiar florestas, simplesmente colocássemos os porcos em uma grelha sobre brasas controladas?

O conceito era simples: ao invés de depender do fogo imprevisível das florestas, poderiam controlar o calor de maneira eficiente, assando os porcos com muito mais precisão e menos desperdício.

João apresentou sua ideia em uma reunião estratégica. Mas, para sua surpresa, não foi recebido com entusiasmo.

4. O CHOQUE COM A CULTURA CORPORATIVA

O Diretor-Geral coçou a cabeça e olhou para João com uma expressão séria.

João, sua ideia até faz sentido, mas você já pensou nas consequências? O que faríamos com os especialistas em incêndios florestais? Com os engenheiros de reflorestamento? Com os algoritmos de previsão climática que gastamos milhões para desenvolver?

E os fabricantes de sensores de umidade do solo? — acrescentou o Gerente de Infraestrutura.

Sem falar nas consultorias internacionais que analisam os padrões de vento para evitar que o fogo se alastre! — completou o Diretor de Planejamento.

João ficou em silêncio. Nunca tinha pensado nisso. O sistema não continuava existindo porque era eficiente, mas porque muitas pessoas dependiam dele para manter seus empregos e status.

5. A LIÇÃO DA HISTÓRIA

A Fábula dos Porcos Assados é uma metáfora perfeita para o que acontece em muitas organizações.

  • Processos antiquados se perpetuam porque "sempre foram feitos assim".
  • A resistência à mudança não é racional, mas baseada no medo da perda de status e estrutura.
  • A inovação muitas vezes não falha por falta de boas ideias, mas pela cultura organizacional que rejeita mudanças drásticas.

No mundo corporativo, vemos isso o tempo todo:

  • Empresas insistindo em reuniões presenciais desnecessárias em vez de adotar videoconferências mais produtivas.
  • Burocracias intermináveis para processos que poderiam ser resolvidos com tecnologia automatizada.
  • Negócios que resistem à transformação digital até serem ultrapassados pela concorrência.

A verdade é que muitas empresas continuam queimando florestas para assar porcos porque não querem lidar com as mudanças que um novo sistema exigiria.

A pergunta que fica é: sua organização está disposta a inovar ou continuará alimentando um sistema que não faz mais sentido?

Fábula Atualizada de Autor desenconhecido. 

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